O presente dossiê dá continuidade a Esquerdas, hoje (internacional), publicado por este site em março deste ano. Membros do Conselho Consultivo de marxismo21 e outro/as estudioso/as – vinculados a diferentes tradições do marxismo e orientados por perspectivas diversas dentro das esquerdas no Brasil – foram convidados para participar deste debate. A fim de orientar seus textos, a Editoria submeteu a todo/as um roteiro de questões; no entanto, tiveram o/as autores/as a autonomia/liberdade para privilegiar temas e questões que julgaram mais relevantes para esclarecer o objetivo central do dossiê: debater o que, hoje, (a) significa ser esquerda no Brasil e (b) quais as tarefas estratégicas que as esquerdas devem desenvolver no sentido de contribuir para uma radical transformação social do país.
Somos gratos aos membros do CC e amigo/as de marxismo21 que colaboram com este dossiê.
Editoria / novembro de 2017
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Anita Prestes, Brasil atual: organização e mobilização populares para vencer a barbárie capitalista
Transcorrido mais de um ano de governo de Michel Temer, não há mais dúvida de que sua posse resultou de um golpe parlamentar-jurídico, cujo objetivo central foi liquidar as conquistas dos trabalhadores brasileiros consagradas na legislação do país. Nesse sentido, são emblemáticas as propostas encaminhadas ao Congresso Nacional das reformas trabalhista e da previdência, assim como os esforços voltados para invalidar os direitos democráticos consagrados na Constituição de 1988, não obstante suas limitações, apontadas por Luiz Carlos Prestes, no que diz respeito ao artigo 142 dessa Carta, ou seja, à manutenção da tutela militar acima dos três poderes da República. Artigo este usado pela primeira vez pelo atual governo para reprimir manifestação popular realizada recentemente em Brasília. ler mais
Diorge Alceno Konrad, Frente Ampla e Popular, com Núcleo de Esquerda, para Enfrentar a Reação Neoliberal e Fascista
Nas vezes em que a esquerda brasileira se deparou com encruzilhadas históricas, foi desafiada a repensar ou consolidar suas práticas e suas táticas políticas. Para tal, apresentou variadas alternativas, poucas vezes unificadas. Mas, nas vezes que avançou em suas lutas, acumulando forças para novas batalhas e representando os maiores anseios da classe trabalhadora, foi usando-se das frentes populares com referencial de esquerda, como nos exemplos da Aliança Nacional Libertadora – ANL (1935), na Campanha da Legalidade (1961) e na Frente Brasil Popular (1989). Cada um destes momentos históricos continha suas especificidades, porém, se tornaram conjunturas significativas de tentativas de mudança estrutural e de luta por um novo modelo de desenvolvimento, em defesa da democracia e dos direitos dos trabalhadores e contra ondas conservadoras que se avizinhavam. ler mais
Edilson José Graciolli, Em defesa da nação, da democracia, do desenvolvimento e dos direitos sociais: desafios e perspectivas para a esquerda brasileira
Analisar concretamente as situações concretas (Lênin) é sempre um caminho necessário e difícil, pois, de um lado, a tantas formas de idealismo e irracionalismo se somam, de outro, requentadas manifestações de esquerdismo e de negligência para com as determinações presentes em cada conjuntura, entre as quais o lugar ocupado pela própria esquerda. Penso ser desnecessária uma incursão ao significado original da expressão esquerda (o que nos remontaria à Revolução Francesa e à divisão estabelecida na Assembleia Nacional, relativamente aos partidários do rei em contraposição aos favoráveis à revolução), bem como a uma detalhada caracterização do espectro coberto pela síntese que a categoria esquerda comporta. ler mais
Francisco Pereira de Farias, Classe trabalhadora e política de esquerda no Brasil
A política de esquerda, na sociedade capitalista, aparece como um conjunto de práticas partidárias, sindicais, mobilizadoras etc., cujo um dos elementos é a prática do partido de representação de classe. A nossa reflexão se inicia, pois, pela análise dessa forma de partido. O partido de representação de classe distingue-se por reivindicar a si a identidade classista. Em geral, o partido político expressa concretamente interesses de classe, exceto aquele que se descola dos interesses sociais mais amplos, como o “partido de clientela” e o “partido-seita”. Pois sendo própria do partido político a busca de conquista da direção do aparelho de Estado, as políticas que o partido almeja se destinam a impactar os interesses sociais, em competição ou antagônicos, no interior da coletividade. Em outras palavras, o partido político tende a constituir-se em mandatário de uma classe social. ler mais
Giovanni Alves, Crise estrutural do capital e problemáticas do marxismo para o século XXI. Breves apontamentos
A partir da recessão mundial de 1973-1975 inaugurou-se uma nova temporalidade histórica do capital: a era da crise estrutural do capital (tal como a denominou István Mészáros). A partir daí, constituiu-se efetivamente o capitalismo global e implementou-se um complexo de reestruturações capitalistas nas mais diversas esferas da vida social. A partie de 1980, nos projetamos para uma nova etapa histórica do sistema mundial do capital. Apenas na década de 1990 o Brasil inseriu-se com vigor no processo de mundialização do capital com as reformas neoliberais de Collor de Mello e FHC. Entretanto, apesar da euforia neoliberal (e pós-moderna) das décadas de ascensão da globalização (1980/1990), com a Queda da Muro de Berlim (1989) e o débacle da URSS (1991), o capitalismo global sob a hegemonia do capital financeiro, demonstrou sua profunda instabilidade sistêmica. ler mais
José Roberto Cabrera, Você nunca ouviu falar em luta de classes?
O texto que segue é uma reflexão sobre os principais desafios postos aos partidos, sindicatos, movimentos e organizações da esquerda socialista no Brasil. O grau em que essas organizações se relacionam com o marxismo, em suas várias tendências, é diverso e plural. A diversidade demonstra força e possibilidades. Assim, as linhas que seguem buscam apontar questões que dizem respeito às tarefas que o atual cenário, dominado pela segunda onda neoliberal, põe àqueles que buscam resistir. Nossa avaliação é menos uma tese e mais um roteiro de discussão e nesse sentido é aberto, mas sem perder o rumo. O modo como a crise do capitalismo se desenvolve e as formas como ele se reestrutura exige respostas contundentes e, ao mesmo tempo, criativas por parte daqueles que se opõem à lógica do capital. ler mais
Marcos Del Roio, As esquerdas no Brasil de um século a outro
Desde a fase final da ditadura militar, no primeiro lustro dos anos 80, as esquerdas de matriz marxista passavam por grave crise, ainda derivada da derrota de 1964 e da repressão estatal permanente instaurada depois daquela data. Por sua vez, a esquerda católica, que já antes de 1964 disputava a direção do movimento operário e popular, viu-se fortalecida no período de resistência e ofensiva contra a ditadura, incentivada em boa medida pela chamada Teologia da Libertação. Os marxistas de extração trotskista, fortalecidos, mas ainda muito minoritários convergiram para o Partido dos Trabalhadores, fundado em 1980. Vários fragmentos de grupos que haviam empreendido a luta armada, originários do leito originário do comunismo brasileiro, fizeram o mesmo. ler mais
Maria Orlanda Pinassi e Silvia Adoue, As esquerdas e a “credulidade servil no Estado
A contrarrevolução brasileira, em sintonia com a contrarrevolução mundial, ou a crise estrutural do sistema de reprodução social do capital, se orienta para reger a mais profunda ofensiva de sua história. O país já sente fortemente os impactos sociais decorrentes de todos os ataques que, há pelo menos três anos sofre diariamente, mas pelo andar da carruagem a coisa não chegou nem perto das suas consequências mais arrasadoras. A verdadeira dimensão disso tudo só teremos quando todas as contrarreformas exigidas pelo empresariado transnacionalizado forem plenamente praticadas no país. Diante do quadro, tendências de esquerda, algumas mais outras menos, e a partir de suas organizações, se movimentam articulando estratégias para enfrentar as urnas em 2018. ler mais
Mauro Luis Iasi, A Esfinge que nos devora: os desafios da esquerda brasileira
O grande desafio da esquerda brasileira é que nos encontramos diante de um duplo problema: ao mesmo tempo devemos enfrentar uma difícil conjuntura na qual um governo usurpador impõe profundas derrotas à classe trabalhadora em uma ofensiva contra os direitos mais elementares; ao mesmo tempo em que estamos diante do esgotamento de um ciclo no qual predominou uma estratégia que agora se esgota. A natureza do dilema nos impõe a capacidade de dar respostas às ofensivas reacionárias, ao mesmo tempo em que empreendemos a difícil tarefa de realizar um acerto de contas com a estratégia que conduziu a classe trabalhadora até o presente impasse. Os termos que configuram o atual quadro conjuntural no Brasil podem ser assim definidos: ler mais
Rodrigo Duarte Fernandes Passos, Hegemonia internacional e capitalismo imperialista em face da esquerda e da concretude no Brasil do século XXI – pequena contribuição para o debate
O objetivo central deste ensaio é responder sumaria e inicialmente à seguinte questão: como definir esquerda e direita tomando-se por base o momento conjuntural de 2017 e alguns de seus nexos com a conjuntura e o processo histórico em termos da inserção internacional do Brasil? Tal questão suscita uma reflexão muito maior que o espaço deste texto comporta. Isto posto, parte-se do entendimento – e do foco – de avaliar a esquerda como todos os movimentos, organizações e iniciativas que vislumbram o socialismo, a emancipação das classes e grupos subalternos e a superação revolucionária do modo capitalista de vida a partir da concretude histórica brasileira. Sabe-se que este entendimento não tem desdobramentos tão simples de entender e de concretizar. ler mais
Valério Arcary, Cinco perguntas para a esquerda no século XXI
Esquerda e direita são conceitos da nossa linguagem coloquial, da cultura popular, portanto, aproximativos, relativos e, em geral, imprecisos. Mas são, politicamente, muito usados e, nessa medida, úteis. Quatro grandes escolhas definem o que significa ser de esquerda. Em primeiro lugar, ser de esquerda é uma escolha moral. Ao ser de esquerda abraçamos uma visão do mundo que considera todas as formas de exploração e opressão indignas. Quem explora ou oprime alguém não pode ser livre. Não é possível a liberdade entre desiguais. Em segundo lugar, ser de esquerda é uma escolha de classe. Ao ser de esquerda abraçamos uma visão do mundo que considera que o movimento dos trabalhadores é a nossa referência de esperança, e suas lutas são as nossas. Em terceiro lugar, ser de esquerda é uma escolha política. Ao ser de esquerda abraçamos um projeto de luta pelo poder. ler mais
Valter Pomar, Desafios e perspectivas de esquerda no Brasil
Há várias esquerdas atuando no Brasil de 2017. O que este texto busca resumir é um dos pontos de vista existentes na militância do Partido dos Trabalhadores, mais precisamente o da tendência petista Articulação de Esquerda, fundada em 1993. Para nós, o ponto de partida de uma estratégia – ou seja, o caminho que a classe trabalhadora deve trilhar para conquistar o poder e construir o socialismo—é a análise das classes e da luta de classes. Ou seja, a análise do desenvolvimento capitalista, de suas contradições e de suas tendências de desenvolvimento futuro. As características estruturais do capitalismo mundial determinam as margens de manobra do capitalismo brasileiro e, por conseguinte, determinam alguns dos limites e possibilidades da luta pelo socialismo no Brasil. As principais características do atual cenário mundial são as crises, as guerras e a instabilidade generalizada. ler mais
Wilson da Silva Santos, Direita e esquerda política. Algumas considerações.
Os últimos trinta anos no Brasil e na Europa foram marcados por um processo de fermentação político-cultural cujas lutas sociais se encontram encerradas num cenário “elástico” que favorece um conjunto de bandeiras reivindicatórias, porém não suficientemente orgânicas para chegar a rupturas de práticas e funções econômicas hegemônicas da burguesia financeira, oligárquica, conservadora e tradicional. Os impulsos e as explosões que aglutinaram essas bandeiras de renovação tentaram captar os diversos sentidos de força progressista para atender às necessidades candentes presentes em vários países. No entanto, parece que a simbiose dessas forças progressistas se mostrou, e ainda ainda se mostra, dispersa e insuficiente ante os problemas emergentes e estruturais que, no caso o Brasil, se apresentam, mantendo-se no “nível da pequena política”, termo destacado por Gramsci quando se referiu ao livro de Raffaelle Ciasca sobre Le origini del programma nazionale (GRAMSCI, 1999, p. 428). ler mais